Não
sei se me irritou mais a comprovação do facto ou a longevidade da suspeita: não
iria de férias nesta Semana Santa. Sou escravo do tempo, ou da falta dele, que
não permite que o trabalho seja entregue nesse safado a que as pessoas
resolveram chamar de Prazo. É quase anedótico, numa época em que tanta gente se
queixa da sua falta, que eu me queixe do excesso de trabalho - ou da falta de tempo,
consumido por um milhão de pequenas coisas que, no fundo, me deixam sem tempo
para nada fazer: o frete do trabalho, o frete das deslocações, o frete do
transporte dos filhos para as suas múltiplas actividades com que ocupam o seu
tempo, e me consomem o meu. Só de noite tenho tempo para ter tempo para mim,
para me ocupar dos meus vícios, socializando virtualmente no Facebook e
escrevendo – sempre fora de horas, quando o silêncio da casa me proporciona a
paz de espírito necessária.
Que
saudades tenho da minha infância, quando o tempo parecia esticar-se
infinitamente, pondo à prova a minha capacidade para arranjar algo com que o
ocupar. Agora é ao contrário: o tempo é tão curto que põe à prova a minha
capacidade para arranjar algum tempo livre para fazer algo.
Crescemos rápido demais e ninguém nos
avisa de que isto acontece (pulhas!). Mal deixamos as nossas fraldas e já as
estamos a pôr aos nossos filhos. Aprendemos as primeiras letras, e quando damos
por ela, já somos doutores. Evoluímos em pouco tempo, mas é quando mais
precisamos dele que deixamos de ter tempo – escapa-nos das mãos, esvai-se
rapidamente num buraco sem fundo, à medida que a nossa vida o consome.
Felizmente que a falta de tempo não me
permite, sequer, sentir a infelicidade de não ter tempo; sobra-me pouco tempo
para tentar ser feliz.
O tempo é verdadeiramente ignóbil, um
autêntico carrasco da nossa felicidade, a menos que o ocupemos com aquilo que
realmente gostamos de fazer - quando isso acontece, sentimos que voltamos à
nossa infância, e só assim somos felizes, esquecendo, completamente, a passagem
do tempo.
Autor: Jorge Santos
Texto 8 - 11º Campeonato de Escrita Criativa
Texto 8 - 11º Campeonato de Escrita Criativa