Porque a
solidão existe. Perfura-nos. Congela-nos num estado embrionário, granítico. É
como uma casca que nos envolve e que só a vontade dos outros pode quebrar. A
tua vontade. A tua existência. A tua imagem. Simples, deslumbrante. Cada gesto
com que rasgas suavemente o ar, sinto que é para mim. O meu teatro pessoal,
onde és a actriz principal de uma peça que eu sempre esperei – nela representas
para mim, só para mim, em todos os dias em que te vejo, e também nos outros em
que só habitas os meus sonhos. Só tu existes. Que se cale o mundo cego que só
vê as diferenças, quando eu nem o tempo sinto quando estás perto. Que interessa
se nasci antes, se nasci para te embalar a alma e te fazer rir e te limpar as lágrimas.
Anda. Apanhemos o sonho das 7h30. Não, é muito cedo: gostas de dormir até
tarde. Será antes o das 11h15, o dos bancos forrados a veludo. Levamos os
nossos livros. Não. Não precisamos de livros: eu leio-te, e tu lês-me. Só o teu
livro me interessa. Não me interessam os poemas, quando o meu poema és tu, a rima
incerta que invade o meu mundo e me rompe a casca dessa solidão onde me
escondi, onde me escondo de um mundo que já não percebe nada de amor, apenas da
confusão dos corpos. Porque o amor puro é a minha única dádiva, sincera e
absoluta. És tu. Sempre foste. Espalho o que sinto num rectângulo de papel A4.
Imaculado. Como tu.
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